As mágoas, a graxa e as utopias
Há pessoas por quem temos um apreço político especial, sobretudo aquelas que arriscaram a pele antes do 25 de Abril, algumas que tendo sido absolutamente pobres, imensas vezes sofreram na carne e na mente a crueldade repressiva do antigo regime. As bandeiras que levantavam foram as que levaram a acreditar que o 25 de Abril e posterior “processo revolucionário” traria um futuro melhor para o povo português - não um futuro imediato, mas um tempo sustentado, inteligente, consistente, (utopias ) que nos colocaria num patamar civilizado, tanto no plano económico como cultural, sabendo que o mosaico de paradigmas da “outra senhora” apenas nos remetia para mais miséria, mais ignorância, mais isolamento.
Não encaixará aqui a lista vasta de antifascistas e de gente que militou contra a ditadura. Seria fastidioso, mesmo sendo a minha própria lista, a que me dei ao trabalho de apontar os nomes, um quase exército, incluindo em grande parte gente anónima - provavelmente a mais constante - para não me perder nas obscuras linhas de tantos discurso de gente que se afirma progressista e de Esquerda. Contudo, julgo que teria uma grande utilidade desenhar o novo mapa da actual Esquerda, assim um Guia de Quem é quem na Esquerda, que causas defende, qual o enquadramento no mundo, etc., um guia que tivesse em conta os que, mesmo sendo figuras públicas, continuaram “pobres”, e dos que enriqueceram desmesuradamente com as sinuosidades obscuras dos laços e dos nós da vida do País após 1974 e respectivo sistema, para não referir o nosso peculiar regime democrático em que o “povo (pensa que) é quem mais ordena”, daqueles que, desiludidos - ou impotentes - passaram a servir-se das fragilidades que eles próprios, tantas vezes, provocaram ou foram cúmplices.
Pacheco Pereira ajudará a entender os motivos e as circunstâncias no livro que anuncia contendo Estudos sobre a Extrema-Esquerda - apesar de me parecer muito mais interessante empreender sobre a Esquerda no seu todo e o que a identifica hoje, para a ajudar a desfazer confusões e clarificar posições individuais que progrediram para outras causas, que não as da Esquerda, continuando, porém, a fazer finca-pé quanto ao seu lugar cativo num universo que já não é o deles. Enfim… um mapa desenhado a partir do momento, por exemplo, para ter um ponto de partida, em que à porta do Hotel Vitória começaram a estacionar viaturas topo de gama, substituindo os velhos chaços populares.
Bom… esta conversa vem a propósito da leitura de dois posts do Conquilhas (1 e 2). Têm a ver com o essencial daquilo que a extrema-esquerda e a esquerda democrática defendiam: a Liberdade e a Democracia. Mais, para detalhar: Direitos, Liberdades e Garantias. E é triste, acreditem, ver hoje, passados trinta e poucos anos, anotado por alguém que foi da extrema-esquerda e, creio, sofreu na pele a repressão do antigo regime, duas questões cruciais, que nem sequer deveriam ser postas em causa agora. São, confiem, dois sublinhados a ter em conta. É que o Tomás, calado, sabe muito, mas mesmo muito. E quando ele engraxa a situação, a ordem é para engraxar também. E se ele nos diz para enaltecer o valor do défice, também deveria sublinhar o valor do buraco, os tais 6% que não foram exclusivamente obra dos opositores à direita, e dos quais, convenhamos, grande parte pertence, por direito próprio, ao actual Excelentíssimo Presidente da República.
Portanto, caro, deixemos a graxa para quem se auto-engraxa muito bem. E entre um processo e outro, entre um negócio e outro, vê lá é se escreves um livrinho, pelos menos tão bom como o primeiro.
Conquilhas
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Abrupto
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